“O PAI NOSSO E A AVE MARIA”
(SERMÕES DE S. TOMÁS DE AQUINO)
PRÓLOGO
AS CINCO QUALIDADES REQUERIDAS PARA TODAS AS ORAÇÕES
1.
—
A Oração Dominical, entre todas, é a oração por excelência,
pois possui as cinco qualidades requeridas para qualquer
oração. A oração deve ser: confiante, reta, ordenada,
devota e humilde.
2.
—
A oração deve ser confiante,
como São Paulo escreve aos Hebreus (4, 16):
Aproximemo-nos com confiança do trono da graça, a fim de
alcançar a misericórdia e achar a graça para sermos
socorridos no tempo oportuno.
A oração deve ser feita com fé e sem hesitação, segundo São
Tiago.
(Tg 1,6): Se algum de vós necessita de sabedoria,
peça-a a Deus... Mas peça-a com fé e sem hesitação.
Por
diversas razões, o Pai Nosso é a mais segura e
confiante das orações. A Oração Dominical é obra de
nosso advogado, do mais sábio dos pedintes, do possuidor de
todos os tesouros de sabedoria (cf. Cl 2, 3), daquele de
quem diz São João (I, 2, 1): Temos um advogado junto ao pai:
Jesus Cristo, o Justo. São Cipriano escreveu
em seu Tratado da oração dominical: «Já que temos o
Cristo como advogado junto ao Pai, por nossos pecados, em
nossos pedidos de perdão, por nossas faltas, apresentemos em
nosso favor, as palavras de nosso advogado».
A Oração Dominical
parece-nos também que deve ser a mais ouvida porque aquele
que, com o Pai, a escuta é o mesmo que no-la ensinou; como
afirma o Salmo 90 (15): Ele clamará por mim e eu o
escutarei. «É rezar uma prece amiga, familiar e piedosa
dirigir-se ao Senhor com suas próprias palavras» diz
São Cipriano. Nunca se deixa de tirar algum fruto desta
oração que, segundo santo Agostinho, apaga os pecados
veniais.
3.
—
Nossa oração deve, em
segundo lugar, ser reta, quer dizer,
devemos pedir a Deus os bens que nos sejam convenientes. «A
oração, diz São João Damasceno, é o pedido a Deus dos dons
que convém pedir».
Muitas
vezes, a oração não é ouvida por termos implorado bens que
verdadeiramente não nos convêm. «Pediste e não
recebeste, porque pediste mal», diz São Tiago.
(4,3).
É tão
difícil saber com certeza o que devemos pedir, como saber o
que devemos desejar. O Apóstolo reconhece, quando escreve
aos Romanos (8, 26): Não sabemos pedir como convém, mas
(acrescenta), o próprio Espírito intercede por nós com
gemidos inefáveis.
Mas não é o Cristo que é nosso doutor?
Não foi ele que nos ensinou o que devemos pedir, quando seus
discípulos disseram: Senhor, ensinai-nos a rezar? (Lc 11,
1).
Os
bens que ele nos ensina a pedir, na oração, são os mais
convenientes. «Se rezamos de maneira conveniente e justa,
diz Santo Agostinho, quaisquer que sejam os termos que
empregamos, não diremos nada mais do que o que está contido
na Oração Dominical».
4.
—
Em terceiro lugar, a oração
deve ser ordenada, como o próprio desejo que
a prece interpreta.
A
ordem conveniente consiste em preferirmos, em nossos desejos
e preces, os bens espirituais aos bens materiais, as
realidades celestes às realidades terrenas, de
acordo com a recomendação do Senhor (Mt, 6,33):
Procurai primeiro o reino de Deus e sua justiça e o resto —
o comer, o beber e o vestir — ser-vos-á dado por acréscimo.
Na
Oração Dominical, o Senhor nos ensina a observar esta ordem:
primeiro pedimos as realidades celestes e em seguida
os bens terrestres.
5.
—
Em quarto lugar, a oração
deve ser devota.
A
excelência da devoção torna o sacrifício da oração agradável
a Deus. Em vosso nome, Senhor, elevarei minhas mãos, diz o
Salmista, e minha alma é saciada como de fino manjar.
A
prolixidade da oração, no mais das vezes, enfraquece a
devoção; também o Senhor nos ensina a evitar essa
prolixidade supérflua: Em vossas orações não multipliqueis
as palavras; como fazem os pagãos, (Mt 6,7). S. Agostinho
recomenda, escrevendo a Proba: «Tirai da oração a
abundância de palavras; no entanto não deixeis de suplicar,
se vossa atenção continua fervorosa».
Esta é
a razão pela qual o Senhor instituiu a breve oração do Pai
Nosso.
6.
—
A devoção provém da caridade, que é o amor de Deus e
do próximo. O Pai Nosso é uma manifestação destes dois
amores.
Para
mostrar nosso amor a Deus, o chamamos «Pai» e para
mostrar nosso amor ao próximo, pedimos por todos os homens
justos, dizendo: «Pai nosso», e empurrados pelo mesmo
amor, acrescentamos: «perdoai as nossas dívidas»
7.
—
Em quinto lugar, nossa
oração deve ser humilde, segundo o que diz o
Salmista (Sl. 101, 18): Deus olhou para a prece dos
humildes.
Uma oração humilde é uma oração que certamente será ouvida,
como nos mostra o Senhor, no evangelho do Fariseu e do
Publicano
(Lc 18, 9-15) e Judite, rogando ao Senhor, dizia: Vós
sempre tivestes por agradável a súplica dos humildes dos
mansos.
Esta
humildade está presente na Oração Dominical, pois a
verdadeira humildade está naquele que não confia em suas
próprias forças, mas tudo espera do poder divino.
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